O declínio de quem não sabe a hora de parar

Confesso que assisto pouca televisão, mesmo a fechada com suas séries que estão arrebatando mais e mais espectadores. Por conta disso costumo ficar de fora do que acontece na telinha entre os atores, apresentadores e outros profissionais que vivem nesse e desse meio. Quando comentaram comigo sobre o caso Maísa e Dudu decidi assistir ao programa onde a polêmica começou para entender o que realmente houve. Meu foco naquele momento era falar sobre o feminino, um dos meus temas de estudo, porém quando fui assistindo ao programa, inevitavelmente minha atenção se desviou para outro ponto.

Acredito que a polêmica girou ao fato de uma menina de 15 anos – Maísa – receber a sugestão de namorar um jovem rapaz – Dudu –, colega dela num jogo de auditório do Silvio Santos. Nada novo, mas a reação dela causou polêmica num momento que os direitos da mulher estão – felizmente – sendo tão discutidos. Alguns consideram que ela foi grossa, outros que ela foi ofendida em público. O meu sentimento na medida que assistia o programa era de… vergonha alheia.

Quando cheguei ao Brasil em 1985 conheci o Silvio Santos através de seu programa de auditório. Sempre admirei a sua capacidade de apresentador que levava todo domingo milhões de telespectadores a passarem a tarde com ele. Embora, como disse, nunca fui fã desse meio de comunicação, era impossível desconhecer a relevância desse homem no Brasil e reconhecê-lo como um profundo conhecedor do povo brasileiro e da arte de fazer programas de auditório. Inteligente, rápido, carismático e respeitoso, fazia que brincadeiras bobas se tornassem passatempos indispensáveis no domingo à tarde.

Pois se passaram 32 anos e fazia muitos que não parava para assisti-lo. Ao vê-lo agora para entender a polêmica, a sensação de vergonha alheia só diminuiu quando ela abriu espaço para um sentimento de tristeza por assistir a essa grande figura que é o Silvio Santos agindo de forma tão desrespeitosa, insistindo com perguntas inconsistentes, tentando a todo custo –  e, claro, conseguir – gerar uma situação que promovesse seu tão frágil programa.

O Dudu, que para mim nem merece algum comentário aqui, e a Maísa, com seu jeito direto de se expressar, não foram suficientemente relevantes para gerar em mim algum desejo de escrever sobre eles; diferentemente da visão desse senhor, com pequenas dificuldades de fala, apesar da experiência, que gerou em mim a reflexão que, se temos o direito de irmos até o fim de nossas vidas, da forma como quisermos – respeitando o direito do outro, logicamente – , de temer cada vez menos o ridículo imposto por um sociedade conservadora; como é digno, especialmente no ambiente público, termos noção de nossos limites e sabermos a hora de desligar as luzes do palco público da vida.

Alguns poderão argumentar que é nobre ver um velho senhor ainda em atividade. Pode ser. Embora não sei – e provavelmente nunca saberei – se é nobreza ou teimosia, mas pelo menos para mim, preferiria guardá-lo na memória como o homem brilhante, do que como um homem que não teve a sabedoria de reconhecer a hora de parar.

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